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quarta-feira, maio 26, 2004
Rita
Capítulo IV – Família Silva
— Você sabe perfeitamente que não posso negar isso. – Geraldo media suas palavras.
— Só faltava negar. Eu vi como vocês se olharam. Desconhecidos não se olham com tanta raiva.
— Eu e seu pai fomos vizinhos durante a minha adolescência. Eu ainda era muito jovem, gostava de aprontar. Certo dia discuti com seu pai e risquei o carro dele.
— Começo a entender. Mas uma traquinagem de adolescente gerou toda essa raiva?
— Não a traquinagem em si, mas as conseqüências que ela tomou. Seu pai ficou muito nervoso, quis cobrar os prejuízos do meu estrago, mas o velho não quis pagar. Resultado: seu José Maria processou o meu pai, que somando gastos com o processo e o que teve que pagar por conta da minha traquinagem entrou em uma crise financeira da qual nunca conseguiu se recuperar. Tivemos que mudar de casa, fomos morar na parte mais pobre do subúrbio, meu pai começou a beber, minha mãe saiu de casa e muitas outras coisas que nem vale a pena contar.
— Entendo o motivo da sua raiva. Você nunca poderia imaginar que aquela sua pequena travessura fosse render o fim da sua família. Grande parte disso se deve ao meu pai.
— Espero que você me entenda.
— Tudo bem. Procurarei nem tocar mais nesse assunto
— Agora por favor volte ao trabalho.
— Voltarei.
***
Para que a história seja bem contada é extremamente necessário que a família Silva seja apresentada. O nome Silva é um dos mais comuns nos brasileiros e falar de toda essa família seria um pouco complicado. Por isso vamos nos ater a uma pequena parcela dessa, basicamente três pessoas: Geraldo, Silvana e Mauro. Como vocês já devem ter reparado, apenas um dos três é conhecido. Os outros são sua mulher e filho.
Um pedaço do passado de Geraldo já é conhecido. Seu pai, Carlos Silva, perdeu tudo. A família se desfez. Tudo de ruim que poderia acontecer aconteceu. Sem dúvida isso tudo foi de fundamental importância para a formação do caráter de Geraldo.
Mulherengo incorrigível, não havia mulher que resistisse a seu charme. Manteve essa mania até o dia em que conheceu o grande amor de sua vida. Tinha 17 anos e acabava de passar por um relacionamento muito conturbado. Foi apresentado a Silvana em uma festa de aniversário e desde então não tirou a menina da cabeça. Mais do que os olhos castanhos e os cabelos morenos, Silvana mostrava inteligência e maturidade incríveis para uma garota de sua idade (15 anos).
Começaram a namorar. Silvana tinha medo de ser somente mais uma conquista na vida de Geraldo. Seus pais não eram a favor do relacionamento. Tudo conspirava contra o casal, mas ela sentia que ele a amava. Nunca havia suspeitado nenhuma traição – apesar de saber que Geraldo não era homem de uma mulher só.
Numa tarde de sábado Geraldo levou Silvana passear no Museu do Ipiranga – era o máximo que o seu apertado orçamento podia agüentar – e, inesperadamente, disse:
— Pela primeira vez na vida posso dizer que estou apaixonado. Você sabe que mulher é uma coisa que nunca faltou na minha vida, porém nunca senti nada além de atração física por elas. Desde que nos apresentaram eu não consigo tirar você da minha cabeça. Você não é só bonita. Você é inteligente, sincera e, principalmente, a mulher que eu escolhi para viver pelo resto da vida. Você não imagina como eu estou nervoso... Mas é agora ou nunca: Silvana, quer casar comigo?
— É claro que eu aceito. Você acaba de me dar a prova que eu precisava. Agora tenho certeza que aquele seu passado de mulherengo ficou para trás. Você não se amarraria a ninguém se não tivesse se apaixonado.
Do pedido ao casamento de fato passou menos de dois meses. A festa foi linda – apesar das restrições orçamentárias. Flores enfeitavam todo o salão. A noiva estava simplesmente deslumbrante, o vestido era indescritível.
A vida de casado não é tão bonita quanto a de namorados, porém os dois nunca deixaram aquele amor do primeiro dia morrer. Dizem que os filhos de casais apaixonados nascem mais bonitos. Não posso dizer se isso é uma verdade absoluta, porém no caso de Silvana e Geraldo deu certo. O filho dos dois, Mauro,nascido no ano das Diretas Já, juntava tudo de bom que seus pais tinham: simpatia e charme do pai e beleza e inteligência da mãe.
Além de ser bonito e inteligente, Mauro teve sorte. Durante sua infância seu pai, até em tão um "pé-rapado", foi ganhando dinheiro. Conseguiu dinheiro emprestado com um amigo e abriu um pequeno barzinho. Não tinha planos de fazer o estabelecimento passar de um boteco, contudo a comida servida lá era gostosa, o atendimento de alta qualidade e nenhum freguês saia reclamando. Essa é a fórmula do sucesso. De um pequeno boteco, o bar de Geraldo evoluiu para uma grande e famosa lanchonete, chegou a abrir filiais em outros estados e resolveu os problemas de dinheiro do seu dono.
Certo dia, quando Mauro tinha 14 anos, Geraldo trabalhava em seu escritório quando Silvana entrou. Ela estava claramente nervosa. Ao ser indagada sobre o motivo de tamanho desespero, ela disse:
— Acho que nosso filho está com algum problema.
Enviado por
Gabriel H.
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