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quarta-feira, maio 12, 2004

Rita


Capítulo II — Do céu ao inferno


— Mas como assim?
— Como assim o que? Você me pediu um copo d'água e um emprego. Sempre fui um bom comerciante. O desejo do freguês é lei.
— Você nem me conhece. Como vai me dando um emprego. Não sabe onde trabalhei. Não sabe nem se já trabalhei.
— Para mim referências não importam. Fui com a sua cara. Gostei de você. Amanhã você começa a trabalhar como garçonete aqui. Chegue cedo e traga sua carteira de trabalho. Precisamos acertar as papeladas.
Tudo bem. Eu sei que isso tudo parece muito irreal. Mas aconteceu. Esse é o começo da história de Rita. Foi assim que sua trajetória começou. Não posso fazer nada. Também demorei para acreditar, contudo pesquisei. Sei que é verdade (tudo bem que eu prometi que diminuiria a conversa com os leitores, mas achei esse comentário pertinente).
Acho que quem acreditava menos no que estava acontecendo era a própria Rita. Empregos não caem do céu. "Como fui arranjar um assim, de uma hora para outra, quando menos imaginava?", essa frase não saia da cabeça da moça. Os motivos que levaram aquele simpático homem a contratá–la são desconhecidos. Pode ter sido de fato que ele tenha gostado da moça. Mas isso é esquisito. Rita não contrataria ninguém dessa maneira. Porém não conheço a verdadeira história e mesmo se conhecesse creio que não seria o momento ideal para contá–la. Continuemos com os fatos oficiais.
Rita voltou para casa muito feliz. Os vizinhos olhavam seu sorriso e viam que algo tinha acontecido. Ao ser indagada sobre o motivo de tamanha satisfação, respondia:
— Estou empregada! Todos estão desempregados na família e de repente chegou esse emprego!
Ficou muito surpresa ao entrar em casa e ver seu pai fazendo uma visita. Só podia ser coisa do destino. O velho José Maria tinha um jeito carrancudo de ser – talvez por conta de seu triste passado. Por mais contente que estivesse seu olhar era triste, sua cara fechada e era raro encontrar sequer um esboço de sorriso em sua face. Coitado do velho homem. Sofreu muito. Sua mulher – a mãe de Rita – fora uma benção em sua vida, porém ele não soube aproveitar o presente de Deus. Depois de muito sofrer por conta do marido, Maria José – os nomes parecidos do casal sempre trouxeram um charme extra – resolveu se matar (mais para frente isso renderá um capítulo). Se arrependimento matasse José Maria já estaria em sua cova, ao lado de Maria José.
Rita entrou de mansinho, seu pai e seu marido conversavam animadamente e ela, apesar da ótima notícia que tinha para contar, não queria atrapalhar o momento de descontração tão raro em seu pai. Os homens conversavam sobre futebol e discutiam a última convocação de Parreira – seu José Maria não conseguia entender como o treinador brasileiro não colocava Marcos no gol. Rita ficou admirando os homens de sua vida conversarem sem ser percebida. Aquele dia era, de longe, o melhor desde o seu nascimento. Ela havia conseguido um emprego e seu pai estava feliz, deixando um pouco de lado o jeito carrancudo de ser.
Seu José Maria e Luís (para quem não sabe, Luís é o nome do marido de Rita) deram conta de que estavam sendo observados e cumprimentaram Rita. A moça entrou na sala, com um sorriso "de orelha a orelha". Ao reparar a alegria da esposa Luís perguntou:
— O que aconteceu meu bem? Por que você está tão feliz?
— Vocês não vão nem acreditar. Eu consegui um emprego!
— Que emprego? – perguntou o pai, excitado com a notícia que a filha dera
— De garçonete. Vocês nem imaginam como eu consegui esse emprego.
Começou a narrar toda a história que conferiu ao rosto dos homens um misto de alegria e espanto.
— Amor, você tem certeza que não tem nada de ruim por trás desse emprego?
— Aparentemente não, mas se tiver eu zarpo fora e não deixo nem pista.
— Como chama essa lanchonete? Você não nos disse o nome.
— É aquela lanchonete famosa. A Silva. Vocês conhecem?
A reação do pai foi a mais estranha possível. Ao ouvir esse nome ele empalideceu, levantou–se da poltrona onde estava sentado e foi até a rua. Parecia não comandar seus atos. Atravessou sem olhar para os lados e por pouco não foi atropelado. Luís foi atrás. Ia na cola do sogro, tentando impedir que o pior acontecesse. Entretanto o pior aconteceu. Não ao sogro, mas a ele. Luís estava morto. Um caminhão havia lhe atingido. Depois de tantos momentos alegres no mesmo dia Rita agora chorava. Luís era um homem bom. Moralista, é verdade, contudo eternamente bom. Mais do que ótimo marido e maravilhoso pai, fora o melhor amigo de sua família.
No dia da morte do marido, Rita mandou avisar no emprego o acontecido e pediu ao patrão um período para ficar em casa antes de trabalhar. O patrão, seu Geraldo Silva, muito simpático como sempre, acatou o pedido da moça e deixou a lanchonete aos cuidados de um funcionário para ir ao velório.
Consolou a nova funcionária dizendo que tragédias acontecem todo dia. Foi cumprimentar a família, um por um, até que quando chegou no pai da viúva houve uma troca de olhares que Rita não pode deixar de perceber. Era um olhar de raiva que partia de ambas as partes, mais por parte do seu José Maria do que de Geraldo, mas a raiva era mútua, não dava para discutir.


Enviado por Gabriel H.